Texto: Rafael Ciscati (2˚ ano – ECA-USP)
Um dos fundadores da revista Veja, Paulo Totti ainda lembra que a redação comandada por Mino Carta costumava ter um dos melhores textos da imprensa brasileira. Ao ver um repórter batendo à maquina, se Mino não percebesse papel espalhado pelo chão, a receita era sempre a mesma: “Reescreva”. Veterano, Totti ainda concorda: “Dificilmente você vai ter a sorte de acertar de primeira”. Boa leitura, esforço e uma pitada de talento, diz ele, são essenciais para aquele jornalista que quer escrever bem. Mas nada, em absoluto, substitui o fator mais importante para uma boa reportagem: a apuração cuidadosa – “Nem o melhor texto esconde uma apuração capenga”, sentencia.
Para Totti, jornalista é aquele capaz de democratizar a informação. Isso, muitas vezes, significa traduzir em termos simples idéias complexas. É só então que o repórter mostra saber sobre o que está escrevendo. E só assim será capaz de compor algo atraente ao leitor: “Você não precisa mais se preocupar em saber se tem acento em joia ou tipoia, tem um programa que faz isso por você”. A preocupação deve estar em ser claro, e atentar para detalhes.
Um cinzeiro à porta de um hotel
Os 55 anos de experiência de Totti lhe ensinaram a importância dos detalhes. E foi ao sair para fumar, à porta de um hotel na China, que ele descobriu como iniciaria sua série de reportagens sobre o país. Viu um cinzeiro com traços delicados, traduzindo toda a paciência oriental, mas produzido industrialmente. O detalhe não era gratuito e, nas mãos de Paulo, serviu para explicar os rumos da China atual. O mesmo vale para qualquer matéria. É importante ser bom observador, para não ater-se a declarações: “Não basta dizer que os moradores da favela Pantanal ficaram 23 dias embaixo de água. Você tem de dizer como era a vida dessas pessoas”, ensina. Isso envolve o leitor e confere credibilidade ao jornalista, que realmente “esteve lá”. Mas o detalhe não pode ser supérfluo.
Outra coisa a ser feita é não tratar o leitor como tolo. É verdade que o texto tem de explicar aquilo de que trata, mas não deve nivelar por baixo. É desnecessário explicar termos técnicos repetidas vezes em uma mesma reportagem. E, dependendo de para quem você escreve, termos conhecidos (como Selic,por exemplo) sequer precisam ser explicados. Além disso, a importância do detalhe não pode suplantar a importância da seleção – bom jornalista é aquele que sabe hierarquizar o que apurou, em vez de publicar tudo.
Redações cada vez menores, diversas pautas para cobrir em um único dia, a reportagem brigando com o espaço para publicidade – tudo isso parece opor-se aos preceitos de Totti, para quem um bom texto, inevitavelmente, será mais longo. Mas ele acredita que o jornalista, apesar das dificuldades, deve ser insistente: “Faz parte da nossa profissão”, define.
Recém saído da palestra de Ricardo Noblat, sobre jornalismo online, Paulo diz sentir-se desconfortável com essa história de que o jornal impresso tem os dias contados: “Grande parte de vocês deve estar convencida de que agora é só internet. Mas eu ainda sou apaixonado pelo jornalismo impresso”. Lembra que a televisão não matou o cinema, o CD não acabou com o vinil, e acredita que a internet não vai pôr fim ao jornal: “Me recuso a pensar que a catedral da internet será construída sobre o túmulo do jornalismo impresso”. A julgar pelo grande número de pessoas que pararam para ouvi-lo, uma coisa é certa – qualquer que seja a plataforma, no impresso ou na internet, escrever bem continuará sendo um desafio necessário.
Na estante
Totti aproveita para fazer sua lista de títulos imprescindíveis:
– Casa Grande e Senzala – Gilberto Freyre. “Para conhecer o Brasil”
– Raízes do Brasil – Sérgio Buarque de Holanda. “Escreve com leveza e cuidado”
– Formação Econômica do Brasil – Celso Furtado. “Esquecido, porém essencial”
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Como melhorar o texto jornalístico
Paulo Totti – paulo.totti@valor.com.br
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