Texto: Patrícia Ogando (2˚ ano – ECA-USP) / Fotos: Patrícia Ogando e Leandro Melito
Foto: Leandro Melito
Os dois gostam de rock n’roll, têm muitos processos judiciais em suas bagagens e são homens de visões apaixonadas. Esse poderia ser o começo de um romance contemporâneo, mas na verdade vamos contar o que rolou na palestra sobre como biografar alguém vivo, com Claudio Tognolli e Lobão. No papo, os dois falaram sobre a gestação de 50 Anos a Mil, livro biográfico de Lobão que conta com a experiência e o respaldo do jornalista Claudio Julio Tognolli.
Antes mesmo do horário de início da apresentação, Tognolli começou a explicar o contexto dessa parceria com Lobão – o biografado, que chegou cerca de uma hora atrasado à sala 714. Nesse meio tempo, Tognolli, com seu jeitão descontraído, falou sobre técnicas de investigação e contou um pouco de sua relação com o cantor e das dificuldades de levantar a história que será lançada em outubro.
Durante mais de um ano Tognolli e Lobão se encontravam até três vezes por semana no restaurante Spot, na região da avenida Paulista. Nesses encontros, o jornalista procurava sempre levar “algum amigo que tinha algum nome ou cargo de responsabilidade de imprensa” para tentar garantir que Lobão não fosse mentir sobre sua história. Assim, se Lobão contasse a mesma história mais de uma vez, Tognolli entendia que aquilo não deveria ser mentira. “Defino isso como um grande divã, em que ele ia se expondo, se expondo”, revela o jornalista.
Tognolli já pensava em investigar todos os documentos que a Justiça brasileira produziu e recuperar tudo que saiu na mídia sobre Lobão. No entanto, o biografado quis, antes dessa investigação, gravar algumas confissões em áudio sobre eventos de sua vida. E esse método mostrou que o músico tem um problema com gravadores, o Lobão captado ali era um cara triste, diferente do que o jornalista conhecia. Tognolli conta que isso o fez lembrar da frase em que Ruy Castro diz que nunca aceita fazer biografia de pessoa viva “porque isso é um trabalho do cão”.
Nessa procura por um método um bom tempo passou, muitas biografias foram utilizadas como referência e finalmente foi escolhido um modelo, tanto para o texto, quanto para o processo de reconstrução desses 50 anos. Quem escreve é o próprio Lobão, mas é o jornalista quem extrai detalhes, informações e o pauta. Tognolli comprou todos os bancos de dados da mídia sobre Lobão e começou investigar os documentos judiciais. Disso montou uma linha do tempo e começou a, como ele mesmo denomina, “colocar o Lobão na ordem do dia”: extrair dele detalhes que só o olhar curioso de um jornalista poderia ter, questionando até a marca da camisa que Lobão vestia em um determinado dia.
Quase no final da palestra, chega Lobão: “Mas e aí, só pra eu não perder o fio da meada”, querendo saber em que ponto estava o papo. Nesse primeiro contato com todos os que estavam presentes, ele já mostrou ter o mesmo jogo de cintura de anos atrás, quando foi preso com um galho de maconha e acabou virando “assessor de imprensa do Comando Vermelho”. Lobão contou esse episódio: ele chegou à cela e um detento negro, com um daqueles sorrisos permanentemente estampados na face, o reconheceu. O detento o chamou para sentar-se próximo dele e logo perguntou: “Aqui na cadeia tem três tipos de pessoas: preto, pobre e burro. Tú se enquadra em qual?”. “Eu sou negão”, foi a resposta de Lobão, cativando na hora Gilmar Negão, que morreu uma semana depois.
Lobão narrou alguns episódios peculiares da sua vida e falou sobre o quanto era maltratado por diversos setores da sociedade pelo seu comportamento “fora dos padrões”. Mas sem nem um pouco parecer querer mudar sua história, sempre tirando sarro da própria cara, diz que as coisas que aconteceram em sua vida foram uma oportunidade, embora dolorida, de vivenciar coisas que não seriam comuns a um jovem de classe média. O cara é um entretenimento, a sala não se esvaziou quando chegou o horário final da palestra. E falando da parceria com Tognolli nessa produção, disse: “no meu caso, se não tivesse essas comprovações (a apuração de Tognolli), iam me chamar de maluco, de novo!”.
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Claudio Tognolli – tognolli@uol.com.br
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